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terça-feira, 22 de maio de 2012

Cantiga de João Roiz de Castel Branco, partindo-se. Luís da Silveira, Cancioneiro Geral, Sec. XVI.

Cantiga

Senhora, pois que folgais
com meu mal, não me mateis;
porque quanto alongais
minha vida, tanto mais
vossa vontade fareis.

E olhai, se m'acabardes,
que nunca me mais tereis,
inda que me desejeis,
para m'outra vez matardes.
Mas já sei o que cuidais,
e de mim o conheceis:
confiais
que, se de morto mandais
que torne, que m'achareis.

domingo, 22 de abril de 2012

F. Pessoa, A Mensagem, 1934.

"O sonho é ver as formas invisíveis
Da distância imprecisa e, com sensíveis
Movimentos da esperança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte -
Os beijos merecidos da Verdade.
(...)
Triste de quem vive em casa,
Contente com seu lar,
Sem que um sonho, no erguer da asa,
Faça até mais rubra a brasa,
Da lareira a abandonar!

Triste de quem é feliz!
Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raíz -
Ter por vida a sepultura.

Eras sobre eras se somem
No tempo que em eras vem.
Ser desconte é ser homem."

terça-feira, 27 de março de 2012

F. Nietzsche, A Origem da Tragédia, 1872.

com base neste conhecimento que temos de entender a tragédia grega como sendo o coro dionisíaco que se extravasa, de forma contínua e sempre renovada, num mundo apolíneo de imagens. Aquelas partes corais, com as quais a tragédia se encontra entretecida, são portanto de certa maneira o regaço materno de todo o chamado diálogo, isto é, de todo o mundo cénico, do drama propriamente dito. Em vários e sucessivos extravasamentos, este solo primordial da tragédia irradia aquela visão do drama: visão essa que é em absoluto um fenómeno onírico, logo de natureza épica, representando porém, por outro lado, enquanto objectivação de um estado dionisíaco, não a redenção olímpica na aprência mas, inversamente, a fragmentação do indivíduo e a unificação deste com o Ser primordial. Assim, o drama constitui a simbolização apolínea de formas dionisíacas de conhecimento e repercussão (...)"

sábado, 28 de maio de 2011

António Ramos Rosa


Há uns anos, conversei horas com António Ramos Rosa, um dos poetas mais produtivos e dedicados de todos os tempos.


Ele possui também o dom do traço.


Deixo-vos com um generoso retrato com a sua dedicatória e duas citações, cada uma delas representantes da sua actividade, ensaística e poética.


"A principal finalidade do homem e o seu dever permanente é a manutenção e o desenvolvimento da sua integridade." .............................................A Parede Azul


"estou pronto para a liberdade de nascer com as palavras
e de nelas me perder até que o turbilhão
se torne o vocábulo vivo e habitável".......Boca Incompleta

domingo, 8 de maio de 2011

"Palavra do Vento, Palavra do Corpo, Palavra do Sangue"


                        Se queres atear o fogo :
                    então terás de te despir a rigor :
preparar uma ceia :
acender uma vela em solenidade :
 e depois fazer esse silêncio renascer
nas cinzas do que comeste :
lê e escreve antes :
prepara-te
reúne-te
convoca-te :
um calor terá de irradiar a câmara do segredo :
ata o volante ao pulso e brinda :
o colo mais nojento deverá estar calmo :
o mar deverá então ser esse calor.

Inunda o astro vigente com a tua prova vulcânica :
espera atentamente que te venham buscar.

Saberás então o fogo antecipado em ti? :
o torvelinho de um nódulo a rebentar de flama cinzenta? :
Não esperar nada -  lembra-te :
mergulhar na primeira espera na primeira vaga
de um tempo outro :
o tempo arderá contigo.
Antes do antes a tua sala é uma nave de escombros? :
de pedras vazias? :
de ninhos achados no escuro? :
levanta os queixos à lâmpada inevitável :
fecunda a cegueira :
para que ela possa acreditar em ti :
olhando os motores do transporte vegetal e térreo :
alarga as omoplatas à ferocidade :
mas concentra-te apenas na espera presa
por um fio esfuziante.

Surge já o talhe à tua frente :
uma criatura consanguínea, breve e
maculada.

No êxodo cumpre teus louvores :
ao caminhar rápido que te leva :
que não te traz :
afaga o animal que então virá contigo :
com quem farás o comércio :
do tempo que ardeste sempre :
dentro de ti.

Numa clareira farás tua fogueira :
e as tuas mãos nascerão aos nichos :
farás coisas muitas :
que o teu tempo não verá :
ardendo lentamente a corda que ainda hoje trazes :
compassada :
por estas paragens subterrâneas.
O tempo arderá sempre por dentro :
assim trarás sempre contigo :
o desenho onde te encontrar.

(Prefácio de "Palavra do Vento, Palavra do Corpo, Palavra do Sangue" - Meu ciclo de poesia mais recente...)