domingo, 22 de abril de 2012

F. Pessoa, A Mensagem, 1934.

"O sonho é ver as formas invisíveis
Da distância imprecisa e, com sensíveis
Movimentos da esperança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte -
Os beijos merecidos da Verdade.
(...)
Triste de quem vive em casa,
Contente com seu lar,
Sem que um sonho, no erguer da asa,
Faça até mais rubra a brasa,
Da lareira a abandonar!

Triste de quem é feliz!
Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raíz -
Ter por vida a sepultura.

Eras sobre eras se somem
No tempo que em eras vem.
Ser desconte é ser homem."

sexta-feira, 13 de abril de 2012

M. Heidegger, O Conceito da Experiência em Hegel, 1942.

"O que nos está restringido a uma vida natural é incapaz de ir por si mesmo para além da sua existência imediata; mas é compelido por um outro a ir para além dele, e este ser-arrancado-para-fora é a sua morte porém, a consciência é para si mesma o seu 'conceito' e, assim, é imediatamente o ir-para-além do limitado e, uma vez que este limitado lhe é próprio, é o ir para além de si mesma; com o singular, é-lhe posto simultaneamente o além como se estivesse simplesmente 'ao lado' do limitado, tal como no intuir espacial. A consciência sofre, portanto, por ela mesma, esta violência de dar cabo da satisfação limitada."

M. Heidegger, A Palavra de Nietzsche "Deus morreu", 1943.

"Talvez um dia, |...| pensemos a era do começo da consumação do niilismo ainda de um outro modo do que até agora. Talvez reconheçamos então que nem as perspectivas políticas, nem as económicas, nem as sociológicas, nem as técnicas e científicas, que nem sequer as perspectivas metafísicas e religiosas bastam para pensar aquilo que acontece nesta era mundial. Aquilo que ela dá a pensar ao pensar não é um qualquer sentido metafísico escondido nas profundezas, mas algo que está próximo: o que está mais próximo, aquilo que, porque é só isso, por isso já constantemente omitimos. Através deste omitir, realizamos constantemente, sem repararmos nisso, aquele matar no ser do ente. |...| Talvez já não nos escape agora de um modo tão precipitado aquilo que é dito no começo do texto comentado, que o homem louco "gritava incessantemente: - Procuro Deus! Procuro Deus!". 
    Em que medida é este homem louco? Ele está delirante."

M. Heidegger, A Palavra de Nietzsche "Deus morreu", 1943.

"O pensar só comecará quando tivermos experimentado que a razão, venerada desde há séculos, é a mais obstinada opositora do pensar."

domingo, 1 de abril de 2012

F. Nietzsche, Assim falou Zaratustra, 1885.

"Um dia, Zaratrustra, ao voltar do seu lugarejo na montanha onde permaneceu longos anos, encontrou um velho eremita na floresta que se lhe dirigiu nestes termos:
- Que vens tu procurar entre os adormecidos? Infeliz de ti, queres então regressar à terra? Queres então arrastar de novo o peso do teu corpo?
Zaratustra respondeu:
- Amo os homens.
O velho retorquiu:
- O homem é uma criatura demasiado imperfeita para meu gosto. Se lhes queres dar alguma coisa dá-lhes esmolas.
Zaratustra insistiu:
- Eu não dou esmolas, não sou suficientemente pobre para isso."